Metalmorphose - Nas raízes do Metal Brasileiro!



Por Écio Souza Diniz

Muitas bandas fizeram a história do metal em nosso país, mas há aquelas pioneiras que são além de uma lenda, precursoras do estilo por aqui. Dentre um time de respeito, como Dorsal Atlântica, Harppia, Azul Limão, Salário Mínimo, Centúrias, entre outros, a banda Metalmorphose, uma das primeiras a lançar um álbum de Metal no Brasil, está de volta pra continuar levando seu legado aos fiéis seguidores do Metal Brazuca. Nos privilegiando em falar mais a respeito da banda, o retorno e muito mais, o Pólvora Zine entrevistou o baixista André Bighinzoli e também contou com a presença do mais novo componente da banda, Leon Manssur, vocalista da grande banda carioca, Apokalyptic Raids. Acompanhem essa entrevista, que ascenderá o fogo de todos os fãs.

Pólvora Zine: Olá André, como vai? Pra começar, fale-nos como é estar de volta, fazendo shows, relembrando os bons tempos e vivendo isso de novo, além claro, de fazer a graça e alegria de muitos fãs dessa época importantíssima do Metal Brasileiro?

André Bighinzoli: Gratificante. Nos anos 80, estávamos no meio de um movimento em construção, literalmente carregando a bandeira do Metal. Hoje, é muito bom tocar para um público consolidado, que reconhece o nosso trabalho. Principalmente estando à frente de uma das melhores bandas, com os melhores músicos que eu já toquei. É muito bom poder emocionar tanto a galera das antigas, quanto ver gente que nem era nascida nos anos 80 cantando as músicas de cor. É uma satisfação.

P.Z: Quando vocês começaram, eram juntamente com Harppia e Dorsal Atlântica, pioneiras do Heavy Metal e se tornariam referência pra muito do que viria a seguir em termos de Metal. Como era fazer esse tipo de música naquela época? Quais as maiores dificuldades e maiores satisfações?

André: Estávamos construindo a cena do Metal. Não existia nem local nem público definido. Nos anos 80, a informação chegava devagar, os jovens não tinham internet para baixar músicas. Quem tinha condições comprava revistas importadas, mas nas lojas de discos só se achava discos das bandas maiores como Iron Maiden. Quem quisesse ir mais a fundo e saber o que era Manowar, Metallica ou Slayer tinha que arrumar uma copia da cópia da cópia da fita de alguém. Tudo também era muito caro. Não existiam estúdios caseiros e nem computadores. Entrar num estúdio pra gravar uma demo custava uma fortuna. A grande satisfação era ver aquele moleque mais novo do colégio indo aos shows do Metalmorphose com a camisa do Ozzy e deixando o cabelo crescer. Não pensávamos que íamos influenciar e incentivar uma geração inteira.

P.Z: Juntamente com quem você iniciou a banda e de onde surgiu a idéia de também cantar em português?

André: O Celso Suckow e o Marcelo Ferreira chamaram o André Delacroix e o Tavinho Godoy para formar uma banda. Eu entrei logo em seguida. Nós batizamos a banda “Pena de Morte” (ideia minha, por influência Sabbática) e depois, felizmente, o Celso veio com o nome Metalmorphose. O grupo já nasceu sendo original porque desde o primeiro ensaio, nós só tocamos músicas próprias. Tínhamos umas trinta músicas antes de surgir o Ultimatum. Todas em português é lógico. Lembre-se que estávamos nos anos 80, jamais passaria pela nossa cabeça cantar em inglês. Não fazia sentido. Os únicos artistas brasileiros que cantavam em inglês eram aqueles bregas dos anos 70 que adotaram nomes artísticos como: Michael Sullivan, Morris Albert (Maurício Alberto) e Mark Anthony (que depois fez muito sucesso com o nome de Fabio Junior) e acima de tudo, vivíamos uma ditadura militar e queríamos muito resgatar a honra do nosso país e da nossa língua. Além do mais, é muito legal ver a galera cantando junto e entendendo (de fato) o sentido das letras. Nossas letras têm papel importante no nosso trabalho. Já vi muita gente que canta em inglês assumir publicamente que enche lingüiça. Sou um dos grandes defensores do Metal em português. Acho que porque fui um dos primeiros a carregar a bandeira do Metal, quero continuar expandindo, atingir mais gente. Tomara que cada vez mais bandas voltem a cantar em português. Nossos CDs vendem na Europa e Japão, sem problemas.

P.Z: No início dos anos 80, estava havendo a consolidação do Heavy Metal com uma onda gigante de bandas surgindo. Vocês acompanharam esta explosão e foram parte da explosão do estilo em nosso país. O que você acha e como analisa o movimento Metal daquela época em detrimento do atual?

André: Gosto do cenário atual. Tenho muito orgulho de ver como foi a evolução da coisa. A diferença básica entre hoje e os anos 80 é que quando a coisa surgiu, a expansão foi naturalmente mais espontânea. Acho que as bandas antigamente eram mais genuínas.

P.Z: Em meio a muita luta, juntamente com o Dorsal Atlântica, vocês finalmente lançaram o EP/Split “Ultimatum”, que se tornou um clássico, sendo o primeiro LP de metal do Rio de Janeiro e também um dos primeiros do Brasil. Neste disco vocês fizeram composições históricas como “Cavaleiro Negro” (considerado por muitos como o carro forte da banda), “Hárpya” (intensa e envolvente), as sarcásticas “Nosso futuro” e “Complexo Urbano” (com forte crítica social) e “Desejo imortal” (outro clássico). Como foi a recepção do público naquela época? Os shows?

André: Fizemos o Ultimatum para o público. Formamos um público cativo que ia aos nossos shows e a galera merecia. A recepção foi excelente. O disco saiu durante o Rock In Rio (janeiro de 85) e eu fui ao Copacabana Palace e dei um na mão do Ozzy (onde será que ele estará?).

P.Z: O que representa hoje pra você ter lançado o primeiro registro com a "Dorsal Atlântica"? O que você pensa sobre eles terem cessado atividade e novo rumo tomado por Carlos Lopes?

André: Foi legal termos feito o disco com a Dorsal, mas também podíamos ter feito o disco sem eles. Na época, as bandas tinham a mesma estatura. A Dorsal cresceu porque era uma grande banda e foi adiante. O Carlos tem um enorme talento, entendo que ele queira dar outros voos. O fato de ele negar a Dorsal agora, instiga mais os fãs. Inteligente como ele é, quem sabe já não estaria arquitetando um retorno?

P.Z: Isto seria realmente muito bom, mas o que podemos e devemos fazer, é respeitar as escolhas dele e não desmerecê-lo por isso. Em 2009, o “Ultimatum” foi lançado em CD, como ocorreu o processo para esse lançamento e como você se sente, vendo que agora muitos puderam ter esse material que é uma relíquia em vinil, que nem todos possuem?

André: Fui eu que tive a iniciativa de lançar o Ultimatum em CD. Achei que era uma injustiça histórica esse disco pioneiro não ter uma versão oficial em CD. O Carlos concordou e preparou com muito carinho a parte gráfica do CD, com o encarte original recriado e mais fotografias da época e depoimentos.

P.Z: Também em 2009, foi lançado o CD “Maldição”, que conta com músicas inéditas da banda de 1986 e gravações ao vivo entre 84 e 85. Conte-nos porque este material não pôde ser lançado na época e quais fatores fizeram a banda cessar as atividades?

André: Na verdade, quando o Metalmorphose se reuniu em 2008, a grande motivação da galera era lançar finalmente a nossa famigerada “demo” de 86. Em 86, o Metalmorphose estava no auge e gravou uma demo incrível. A banda, que estava com a autoestima lá no teto, resolveu apostar num contrato com uma “major”. A gente pensava “Porra, não é possível que a EMI contratou a merda de uma “Legião Urbana” e não contrata a gente que toca muito mais que esses caras!” rsrs. Pois é. Então, taí o divisor de águas: Enquanto a Dorsal mergulhou no underground, a gente queria aparecer no “Chacrinha” e um contrato com uma gravadora que nem o do “RPM”. O final da história todo mundo conhece: a Dorsal galgou a sua história enquanto o Metalmorphose, apesar de sua qualidade, definhou e morreu na praia (literalmente) em 88 depois que o EP “Correntes” foi abortado pela gravadora. Pois bem, como em 2008 o Metalmorphose estava há muitos anos no ostracismo, resolvemos lançar antes o “Ultimatum” para desenferrujar a nossa imagem e posteriormente, em 2009, foi lançado o “Maldição”, que se consiste na nossa “demo” de 86 (a menina dos olhos) e mais algumas coisas ao vivo do período do Ultimatum.

P.Z: O que você acha do lançamento do “Maldição”, depois de tanto tempo, visto também a excelente qualidade das composições como “Rebeldia”, “Minha droga é o Metal” e “Esperança nunca morre”, calcadas em um Heavy Metal mais pesado, mostrando mais qualidade e técnica dos músicos? Você acha o “Maldição” melhor que o “Ultimatum”? Como os headbangers têm respondido a essas músicas?

André: O Maldição é uma evolução natural do Ultimatum. Nossas composições evoluíram e nós também evoluimos tecnicamente. Ambos os discos são muito honestos e genuínos. No Ultimatum, por exemplo, colocamos uma flauta em Harpya e em seguida atacamos de “Complexo Urbano” (meio-Motörhead-meio-punk-rock) num disco que tinha “Império de Satã” (música da Dorsal Atlântica) do outro lado... Sempre fomos aplaudidos em todos os lugares que tocamos. Lembro também que tínhamos muito mais músicas que foram descartadas de ambos os discos por falta de espaço. Não dá pra dizer qual dos dois discos eu prefiro.

P.Z: O que você pensa sobre a fase Hard/glam adotada pela banda há anos atrás? E os seus ex-membros que foram tocar pop Rock?

André: Não condeno nada. Quando a tua referência que era assim

 e do dia pra noite ficou assim,

 você há de convir que é foda. O Metalmorphose sempre quis a fama em nível nacional. Isso é pra quem pode. Depois que eu saí do Metalmorphose voltei às raízes do Metal, toquei muito Rock and Roll e Blues. Isso também é pra quem pode.

P.Z: Gostaria que nos dissesse, o que você acha da formação atual da banda? Como é estar trabalhando com caras como Leon Manssur (Apokalyptic Raids) e Felippão, que além de serem ótimos músicos, são fãs da banda e cresceram a ouvindo?

André: São excelentes músicos e bons amigos. Eles conhecem e respeitam muito o Metalmorphose. Está sendo um prazer tocar com eles.

P.Z: Apesar de ser um estilo diferente, o que você acha do Apokalyptic Raids?

André: Uma merda. BRINCADEIRA!!!! O “Apokalyptic Raids” é uma banda que tem um trabalho sério e consistente. O Leon está há anos na estrada e é muito competente em tudo que faz. Considero que o “Apokaliptic Raids” está no rol das bandas mais importantes deste país.

P.Z: Vocês fizeram um show histórico com a formação original da banda no Teatro Odisséia (RJ) em 2009. Como foi este show? A quantas está o processo pra lançá-lo em CD até o fim deste ano?

André: O show foi uma catarse! Lavou a nossa alma. O CD está em processo de fabricação e vai chegar ao mercado em junho de 2010. Quando você ouvir o CD, vai perceber a energia do que foi aquilo lá. Foi a primeira vez que o Metalmorphose se apresentou com a formação original desde 1985! Posteriormente, será lançado o DVD desse show antológico.

P.Z: O que você acha da participação de vocês no documentário e CD “Brasil Heavy Metal”, coordenado pelo guitarrista “Micka” Michaelis, que conta a história do Metal no Brasil? E qual a importância você vê no retorno de bandas daquela época como “Harppia”, “Centúrias”, “Salário Mínimo” e “Viper”? Você acha que pode ajudar a consolidar uma nova e produtiva fase de Heavy Metal feito com honestidade?

André: Estamos dando toda força pro Micka. Tocamos no ano passado em São Paulo com o “Salário Mínimo” e “Volkana”. Espero que as bandas voltem com força total, como está acontecendo com o “Metalmorphose”.

P.Z: Falando em bandas das antigas, o “Harppia” se apresentou recentemente em Pouso Alegre, Sul de Minas e o “Salário Mínimo” se apresentará na 12° edição do “Roça and roll” em Varginha, dia 12/06. Vocês têm algum plano de nos presentear com um show por esses lados?

André: Já fechei com o Bruno pro “Roça and Roll” 2011. Estamos loucos pra tocar pelo interior. Alguém se habilita pra fechar uns showzinhos?

P.Z: Realmente será muito bom poder assistir um show de vocês por aqui. Dou todo incentivo ao promotores de evento a convidá-los para tocar. André, obrigado pela entrevista. Sucesso e prosperidade pra vocês. Encerrando, fale-nos um pouco sobre os planos futuros pra banda e pode deixar uma mensagem aos fãs.

André: Eu que agradeço, Écio. Nosso plano é lançar um CD com músicas novas para 2011. Mando um abraço para a galera do Pólvora Zine, a todos(as) fãs e a gente se vê na estrada!


Leon Mansur é um grande fã da Metalmorphose e nada mais interessante, que ouvir um fã que realiza seu sonho tocando com a banda que ouve a tanto tempo.


P.Z: Mansur, conte-nos como ocorreu a sua entrada na banda.

O André Delacroix (batera) me conhecia do “Apokalyptic Raids”, e eu acomepanhei o trabalho dele no “Dust From Misery” e “Imago Mortis”, ele se liga em sons mais extremos. Até cheguei a testá-lo para as baquetas do “A.R” em 2001, mas acabou não funcionando. Naquela ocasião, ele tinha me mostrado a demo “Maldição”, que eu passei para CD. Isto ficou guardado até 2008, quando o Metalmorphose voltou à ativa com outra formação. Encontrei o Bighinzoli (André) e entre um uísque e outro, acabamos conversando sobre eu masterizar os relançamentos em CD, o que já me deixou muito feliz pois eu curto bastante o som deles. Continuei em contato e ajudando na distribuição dos CDs. O Metalmorphose sempre foi uma banda de 2 guitarras, as músicas foram compostas e arranjadas para 2 guitarras. Então agora no início de 2010, quando precisaram de um guitarrista, eles me chamaram, mas eu não me achava à altura. Depois de uma certa insistência deles (ainda bem!) e sabendo que teria o Felippe para segurar nos solos, fizemos um teste, e, pelo visto, agradei! Agora, acabo de mixar também o álbum ao vivo, gravado em 2009, para lançamento em breve!

P.Z: O que representa pra você estar tocando com uma banda pioneira no Metal brasileiro?

É um sonho, eu nem poderia imaginar. O “Ultimatum” foi um dos discos que mais teve impacto na minha formação. Eu me lembro de ter em 1985 uma fita com “At With Satan” do “Venom” de um lado e o “Ultimatum” do outro. O disco já era raro na época, só um cara no meu colégio tinha, mas acabei arrumando uma cópia depois. Aquilo era a prova, muitos anos antes, de que era possível fazer som pesado no Brasil. E o aspecto de feito à mão, conferia ainda mais o aspecto de um seleto grupo que tinha acesso. Curiosamente, eu só fui ter contato com o som do “Stress” depois de muito ouvir o “Ultimatum”.

P.Z: Como tem sido a reação dos fãs, tanto do “Apokalyptic Raids” quanto do “Metalmorphose”?

Ainda está recente, como eu disse, alguns meses, mas o pessoal fã do “A.R” em geral curte também o “Metalmorphose”, assim é Metal em dobro!

P.Z: Você tem planos elaborados pra sua atuação ao lado do André (Bighinzoli)?

Sim! Claro que a gente sempre imprime nossa marca. Mas em vez de impor meu estilo e sonoridade característicos do “A.R”, meu objetivo é tocar no “Metalmorphose” como a banda era na época. Tenho feito um grande esforço do ponto de vista técnico e estilístico para me adequar ao “Metalmorphose”, eu que nunca toquei com 2 guitarras. Não existe um manual de instruções para essas coisas! Por outro lado, eu sempre fui um grande fã de “Manowar”, “Accept”, “Purple” e principalmente da pegada do Tony Iommi, mas nunca tive muita oportunidade de dar vazão. Até fiz algumas músicas no limite do Heavy Épico/Doom no “A.R”, e no que couber continuarei fazendo, mas o “Metalmorphose” é certamente uma nova dimensão pra mim. Os ensaios tem sido intensos para fazer cada detalhe dos arranjos soarem como devem. Quanto aos palcos, eu pretendo usar um visual não muito diferente do que eu uso no “A.R”, só que menos carregado.

P.Z: Eu presumo que você deva estar bem inspirado pra colaborar com suas idéias em futuras composições. Qual contribuição musical você acha que pode acrescentar a banda?

Primeiro, estou estudando o repertório existente, incluindo músicas inéditas como “Luta” e “Rock’n Roll no Inferno”. São muitas fases, e estou absorvendo o estilo “Metalmorphose” de compor. Na verdade, o estou devorando! Creio que em breve vão surgir contribuições minhas. Os planos são para um disco de inéditas em breve...

P.Z: Qual disco e fase do “Metalmorphose” você mais gosta? O que te chama mais atenção na banda?

O “Ultimatum” tem composições fáceis, é espontâneo, o “Maldição” mostra mais peso e composições mais bem pensadas, e é o maior desafio para mim agora do lado de cá das 6 cordas... Fico no meio dos 2 em preferência. Mas tenho curtido muito tocar “Correntes” também. Quando você desconta o histórico de roupas a lá “glam californiano”, o que sobra é uma ótima música com riffs matadores, como todo o repertório do “Metalmorphose”. É isso que mais me chama atenção, a qualidade das composições e dos músicos.

P.Z: Você sairá junto com a banda no documentário “Brasil Heavy Metal”?

Acredito que o material já estava gravado quando eu entrei.

P.Z: Valeu aí Mansur. Sucesso nessa jornada. Deixe uma mensagem pra todos que acompanham seu trabalho.

Obrigado pelo espaço! Fiquem ligados no trabalho do “Metalmorphose”, o disco ao vivo está matador !!! E vamos pra estrada em breve!!!

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     Metalmorphose no Calabouço (2010)









 
 
 
 

Época do "Ultimatum"