Por Écio Souza Diniz
Desde o retorno da DORSAL ATLÂNTICA em 2012, Carlos Lopes vem numa onda crescente de criatividade, explorando acentuadamente a união de peso e agressividade com elementos novos agregados a sonoridade da banda, muitos dos quais trazendo acentos de música brasileira (ex: nordestina) nos riffs. Além disso, Carlos tem investido mais em letras e segmentos vocais discursivos e falados, amparando os contextos sócio-políticos que o Brasil tem vivido na última década.
Nesse contexto, Pandemia não é só o quarto disco de estúdio desde o retorno e financiado coletivamente pelos fãs, mas representa o ápice desse experimentalismo sonoro mencionado e chega a impressionar pela riqueza de detalhes nos arranjos dos riffs e andamentos aliada a roupagem agressiva. Podemos facilmente considerá-lo como o álbum mais complexo da banda desde Alea Jacta Est (1994) e até mais que este.
Carlos acompanhado por seu irmão Claudio Lopes (baixo) e o experiente batera Braulio Drumond (AVEC TRISTESSE, PAUL DI'ANNO, UNEARTHLY e outros) executam uma poderosa base instrumental para embasar um contexto lírico inspirado no livro A Revolução dos Bichos (1945) do escritor inglês George Orwell. Juntamente com a exploração de novos timbres no vocal de Carlos, também é notável a versatilidade trazida por Drumond que transita de forma eficiente por elementos do metal, hardcore, punk, metrancas típicas do black metal e até ritmos regionais brasileiros.
De certa forma é uma tarefa difícil selecionar destaques em um álbum cuja assimilação auditiva não é imediata e também as faixas se interconectam sonoramente. Mas nesse intento, discorro aqui alguns pontos centrais do valor desse disco para ser um dos pontos altos de lançamentos em 2021.
A começar pela abertura do álbum com faixa título que apresenta um inesperado e interessante início acústico, que é seguido de uma entrada agressiva e rápida e mudança marcante de andamentos, retratando com acurácia artística e poética o obscurantismo, extremismo e retrocesso social que assola o Brasil e o mundo.
Já em Burro, o instrumental entra de sola na pegada HC tão característica da banda, remetente ao excelente Straight, mas com roupagem moderna e atualizada.
Cães é pesada e com uma mudança de andamento inteligente e bem colocada que incluí passagem bem colocada com canto gregoriano.
Um gradiente musical impressionante carateriza a faixa Combaterei, trazendo a entrada mais pesada da história da banda, com ritmo metranca na batera numa pegada black/death e terminando num emotivo e melancólico final semi-acústico. Ou seja, uma faixa que faz o ouvinte transitar entre extremos de emoções.
Outro exemplo de elemento novo na sonoridade da banda é mostrado com Povo (Inocente ou Culpado?) com seu andamento mais arrastado, distorcido e cadenciado, numa pegada mais doom/stoner metal.
O patamar mais alto do disco chega com Terra Arrasada (Treva que nunca acaba), um bombástico épico e dinâmico, cheio de nuances e variações.
Para finalizar de forma contundente e reflexiva, também inédita na musicalidade da banda, Número 28 traz um encerramento com uma pegada progressiva e viajante constituída de sonoridade tribal, olodum e elementos de candomblé como fundo de recortes de diversas falas políticas, reflexão social e dialeto indígena.
Acredito que meu simples resumo da obra consiga dar a você, leitor, um vislumbre do que se esperar de Pandemia. Despertou curiosidade? Pode ir sem medo para audição imediata! Nota: 9.5/10.
Faixas: 01 Pandemia solo do começo / 02 Burro (É Só Cair de Quatro Prá fazer Him-Hom) / 03 Cães / 04 Pobre de Direita / 05 Combaterei / 6 Gorilas (Nó Passarán) / 07 Infectados (Teocracia e Narco-Estado) / 08 Povo (Inocente ou Culpado?) / 09 Resistência (Não Resiste) / 10 Terra Arrasada (Treva Que Nunca Acaba) / 11 Número 28
Mais informações: